AC DE PAULA
Dom Quixote Tupiniquim
Textos
CARNAVÁLIA DO LIRÍSMO COMUM ! capítulo II
A CARNAVÁLIA DO LIRISMO COMUM !
    Capítulo II


Um dos passatempos prediletos de Uirapuru era colecionar estrelas, ele se maravilhava com aquelas criaturinhas policromicas que de vez em quando se transformavam em borboletas multicoloridas, e tudo ficava mais brilhante, uma miscigenação total, sem aquele papo de preconceito.

Em certos momentos ele olhava as estrelas julgando que elas eram mariposas, voando em torno de um holofote gigante que iluminava os sonhos da menina na janela!  Por tudo isso, e mais alguma coisa, é que todo mundo dizia que ele era diferente, ele estava mais falado do que a menina dos olhos do olho da rua!  Uirapuru sabia e não se importava nenhum um pouco com o que as pessoas pensavam a seu respeito.

Um poeta louco, ou um louco poeta, palmilhando as galáxias, batendo papo com um rato!  Ainda por cima um rato manco, só tinha três patas, e de nome folclórico, Berimbau Pererê Pereira.

Mas ele achava tudo muito natural e até mesmo costumava dizer que de poeta, rato e louco, todo mundo tinha um pouco, e ainda arrematava enfaticamente:
             - O meu pouco foi demais!

O importante é que ele não se achava diferente, afinal era um cara antenado, ciente dos seus direitos e obrigações, devida e regularmente inserido no contexto da paisagem das estruturas sociais!

Em suma, era mais um dente da engrenagem da máquina do cotidiano. Quando conseguia comprar a crédito, atrasava os pagamentos, era freguês de carteirinha do SPC, não tinha carro mas vivia reclamando do preço do combustível, quando não tinha dinheiro trocado e o cobrador não tinha troco, era sempre ele que se ferrava.

Devia dinheiro emprestado, mil e um favores, e de tanto driblar credores já se tornará um craque perfeito. Vivia ligado de esperança, furava fila sempre que possível, não se conformava com a morosidade e o custo injusto da justiça, levava pacote na cabeça, cruzado pela cara, mas mesmo assim andava à mil!  

Era o perfeito herói do novo milagre brasileiro, parecia Papai Noel, vivia de bolso vazio e de saco cheio!

Ante o triunfo de incontáveis nulidades, já que vencer nem sempre era possível, ele se via propenso a aderir a hipocrisia reinante aliada a teoria das falsas verdades e dos falsos valores, e entre os trâmites legais e os trambiques ilegais, mas vantajosos, como a maioria dos cidadãos acima de quaisquer suspeitas, via de regra escolhia a segunda opção, e sem remorso pensava,

                       - Assim caminha a humanidade, levando nas costas a mochila da pouca vergonha, protegida pelos guarda-chuvas da impunidade!  

Por várias vezes ele convidara Berimbau para acompanhá-lo num safári celeste para caçar estrelas. Berimbau Pererê Pereira, era simpático à idéia, pois nas savanas do infinito vagava também o parmesão gigante que era o patrocinador das suas incontáveis noites de insônia.

Mas o grilo do rato era levantar âncora do porto seguro da realidade, para singrar os mares dos sonhos.  Ele preferia curtir  numa boa, a maré baixa e a maré cheia, debruçado na janela dos seus castelos de areia!  

Mas a carne é fraca, até mesmo a de um rato, e como dizem por aí, ninguém é de ferro e sempre existe a primeira vez!


antonio carlos de paula
poeta e compositor
AC de Paula
Enviado por AC de Paula em 19/01/2007
Alterado em 14/01/2010
Comentários
Site do Escritor criado por Recanto das Letras